Um encontro para todas as pessoas que desejam se tornar melhores aliadas na causa antirracista.
Este encontro foi pensado como forma de proporcionar um espaço de trocas e reflexões sobre a luta antirracista. Se você é uma pessoa…
recém iniciada na temática antirracista,
que busca ser uma melhor aliada nessa luta,
que tem dúvidas e/ou quer aprender mais sobre conceitos básicos em torno dessa temática,
que já ouviu falar, mas ainda não sabe muito bem do que se trata esse tema
…esse evento é pra você!
Vamos conversar sobre antirracismo de forma leve, descontraída e didática. Através de exemplos compartilhados pelas pessoas presentes e de casos noticiados pela mídia brasileira e internacional, discutiremos sobre os diversos tipos de discriminação presentes em nossa sociedade. Além disso, vamos refletir sobre formas de desconstruir e combater esses preconceitos em nosso dia a dia.
No contexto da migração, é especialmente interessante cultivar o pensamento crítico em relação às diversas formas de discriminação que podem se apresentar em nosso entorno porque, ao migrar, muitas vezes entramos em contato com novas formas de racismo e discriminação que não conhecíamos em nossos países de origem. Por isso, é preciso ter atenção e exercitar o olhar antirracista sempre!
Interessou? Então vem com a gente!
Quando: 05.06.23 e 12.06.2023, das 19:30h às 21:00h (Horário de Berlim)/ 14:30-16:00h (Brasília).
Onde: Pelo Zoom
Investimento: 40,00 Euros
Vagas limitadas!
Atenção! Se o seu interesse é grande, mas não pode pagar esse valor no momento, entre em contato com a gente. O valor da taxa não deve impedir a sua participação.
Cris Oliveira, mediadora e idealizadora deste projeto, é uma mulher negra, nordestina e imigrante. É professora de inglês (EFL) e alemão (DaZ), mestre em linguística (linguagem e cognição) e em pedagogia inclusiva (língua e inclusão) pela Universität Bremen. Cris também é uma das responsáveis pela curadoria de cursos de formação de professores no Landesinstitut für Schule em Bremen nas áreas de Educação Bilíngue e Educação Antirracista no centro de assuntos “interculturais” do instituto, além de coordenar a rede de pegadogogos e pedagogas com histórico de migração.
Para participar, faça a sua inscrição através do link: https://forms.gle/op45RranjZcnJqrw7
Esperamos vocês!
Acesse o nosso Instagram também: @continuidadenaimigracao
Somos um grupo de três pessoas que buscam discutir e promover espaços de acolhimento e de construção de conhecimento acerca da migração e as suas repercussões emocionais. Temos como objetivos promover o desenvolvimento pessoal, educacional e social tanto dos imigrantes quanto dos profissionais que trabalham nesta área. Essas iniciativas nos tocam profissional e pessoalmente, já que temos histórico de migração dentro do Brasil e fora.
Flora é psicóloga clínica sistêmica, com especialização na Alemanha em constelações sistêmicas e na área da migração e seus processos psicossociais. Atuou mais de 11 anos na área de assistência à família, crianças e adolescentes juntamente com o conselho tutelar de Bremen. Co-fundadora do Continuidade Podcast com conteúdos sobre imigração e seus aspectos emocionais, que nasceu em 2019. Atualmente, realiza atendimentos clínicos. (@floracampe.psi)
Daniele é psicóloga e neuropsicóloga, com especializações e experiência em instituições de saúde, como centro de reabilitação física e hospitais, e no consultório. No seu mestrado, pesquisou a qualidade de vida e aspectos emocionais das crianças e adolescentes com esclerose múltipla. Faz parte da equipe do Continuidade desde 2020. Trabalha com projetos com mulheres imigrantes e com atendimentos clínicos. (@danielestivanin.psi)
Cris é educadora com um trabalho focado em inclusão e antirracismo. Co-fundadora do Continuidade Podcast com conteúdos sobre imigração. Ela mudou a sua função no projeto, após boas conquistas no trabalho e com a chegada de uma criança linda. Atualmente está de licença maternidade, mas continua nos acompanhando com seu olhar atento, refinado e amoroso, como uma verdadeira conselheira de assuntos gerais. (@asaltibamca)
O Continuidade nasceu como um podcast que busca discutir a migração a partir dos aspectos emocionais, sociais e educacionais, idealizado por Cristiane Oliveira e Flora Regis Campe que moram em Bremen, na Alemanha. A ideia surgiu em 2019 após as duas vivenciarem na pele os desafios da imigração, suas construções, e de cursarem juntas uma especialização sobre os aspectos psicossociais da imigração.
Os assuntos e reflexões que elas observavam nas suas atuações profissionais e também nas rodas de conversas com pessoas próximas, precisavam circular em outros espaços e alcançar mais gente. E assim o podcast nasceu e pôde ser ouvido em diversos países, na casa das pessoas que também compartilhavam de histórico de imigração e todas as suas expectativas, dores e delícias. Além dos episódios, foram construídos também workshops sobre identidade, relacionamentos e sobre a luta antirracista num espaço de trocas e de autocuidado. Com o tempo criamos o núcleo de Psicologia e Saúde Mental, conduzido pelas psicólogas Flora Regis Campe e Daniele Stivanin, que buscaram produzir conteúdos para o podcast, para o site e para as redes sociais com um olhar psicológico.
A equipe cresceu e tivemos muita produção, com olhares diversos. Passamos por diversos momentos de mudanças pessoais e profissionais, que incluíram oportunidades profissionais sonhadas, uma pandemia, luto, mudanças na carreira profissional e a chegada de um bebê.
Foi preciso colocar o “pé no freio”, repensar o formato e também as possibilidades atuais de cada uma. Por isso, levamos um tempo em pausa aqui, mas nos bastidores tivemos muitas reuniões e reflexões.
Como podem imaginar 2022 foi um ano de muitos desafios para as pessoas que faziam o Continuidade Podcast acontecer. E depois de muita conversa, trocas e um enorme carinho por esse projeto, decidimos retomar as atividades em 2023 com workshops para mulheres imigrantes e também construir novas redes entre profissionais que atendem imigrantes. Tem muita coisa boa e bem cuidada vindo aí! O projeto Continuidade mudou, mas continua com a mesma essência de favorecer o crescimento emocional e o empoderamento da própria história na imigração.
O nosso último episódio foi sobre a temática da depressão sazonal ou o chamado transtorno afetivo sazonal (Seasonal Affective Disorder – SAD, em inglês). E por que é relevante abordar este tema um tanto desconhecido? O que pode ser feito, se eu notar que eu ou uma pessoa próxima tem estes sintomas? Estas são algumas das informações que vamos abordar neste texto hoje.
A depressão sazonal é um conjunto de sintomas que podem ocorrer nos períodos de menor incidência de luz solar e menores temperaturas, como são os meses de outubro a março no hemisfério norte. Estes sintomas podem variar de intensidade e de frequência, configurando ou não um diagnóstico formal.
E quais seriam os sintomas mais comuns da depressão sazonal? Os relatos mais frequentes são de redução do nível de energia, com sensação de fadiga ou dificuldades em realizar a rotina normal; aumento de apetite, principalmente de carboidratos e alimentos doces; alteração do padrão do sono (como maior sonolência ao longo do dia ou dificuldades para iniciar o sono); rebaixamento das funções cerebrais, com problemas de pensamento, como dificuldades de concentração e lentificação no processamento de informações; problemas no humor, particularmente depressão ou sintomas depressivos, como pessimismo, sentimento de culpa, diminuição da auto estima, desespero e apatia. Também pode ser observada sintomas ansiosos e a diminuição da socialização, com irritabilidade ou diminuição do interesse em atividades que antes eram prazerosas.
O chamado “Winter Blues” é o rebaixamento ameno da motivação e do funcionamento geral, com os sintomas citados acima, mas mais brandos na frequência e intensidade que a depressão sazonal (SAD). O diagnóstico de SAD, por sua vez, pode ser realizado após três ou mais invernos consecutivos de sintomas. Pode acontecer em qualquer idade, mas principalmente com início entre 18 e 30 anos ou diante de uma mudança do local de onde mora, por exemplo, mudança para um país com menor incidência das horas de sol ao longo do dia.
Uma questão importante é observar como o seu corpo responde ao inverno e as reduzidas horas de sol. Eu me sinto mais cansado, mais lentificado nas minhas atividades corriqueiras, menos produtivo e mais irritado neste período? O quanto isso me afeta e traz prejuízos nas minhas atividades e relacionamentos? Estes são os nossos parâmetros para que possamos nos comparar e ficar atento para possivelmente pedir ajuda.
Diante dessa auto-observação, podemos conversar com profissionais da nossa confiança seja o médico ou psicólogo. Na consulta com o seu médico de família, ele pode, por exemplo, verificar o seu estado de saúde geral, realizar a dosagem da vitamina D e checar as queixas relacionadas a depressão sazonal, para possíveis encaminhamentos e uso de medicação.
No caso de confirmação de um diagnóstico, o tratamento pode envolver psicoterapia, medicação e estratégias de bem estar. E aqui vamos citar algumas delas:
reconhecer estratégias que façam bem (e elas são pessoais e precisam ser customizadas por cada um!)
cuidado com a alimentação e rotina;
cuidado com a rotina de sono;
tentar construir uma rotina de atividade, principalmente caminhadas em áreas externas e durante o dia;
uso de ponto de luz em casa, como iluminar a sacada, ter velas nos cômodos, objetos coloridos e flores;
uso da terapia de luz, conforme recomendação médica;
práticas de meditação para auxiliar no maior contato com as reações corporais, respiração e com os sentimentos e forma de pensar;
conhecimento de rituais e saberes do local de morada como rituais de St. Martin, tradições de mercados de Natal, atividades de inverno, decoração de outono e inverno em casa; Glühwein, chás de inverno. Podemos conversar com nativos ou com pessoas que vivem aqui há mais tempo, quais as atividades que as pessoas se engajam neste período;
autoconhecimento e observar como está a sua vivência de imigração;
buscar grupos de apoio em seus locais de morada
procura de novas aprendizagens, como novos cursos.
Conhecer esse diagnóstico é importante para dar nome aos sintomas e sentimentos, para poder reconhecê-los e não gerar culpa e autocrítica exacerbada. Cabe lembrar que ter informação é cuidado e empoderamento! Sempre merecemos cuidado! Não é frescura ou fraqueza ou falta de fé. A nossa saúde mental é muito importante, não se esqueça disso e valorize!!
Quer saber mais? Escute o nosso episódio do podcast!
Por Daniele Stivanin
Referências:
American Psychiatric Association (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5 Porto Alegre: Artmed, 2014.
Gatón Moreno, Miren Aiala, González Torres, Miguel Ángel, & Gaviria, Moisés. Seasonal affective disorders, “winter blues”. Revista de la Asociación Española de Neuropsiquiatría, 35(126), 367-380, 2015.
Melrose S. Seasonal Affective Disorder: An Overview of Assessment and Treatment Approaches. Depress Res Treat. 2015:178564, 2015. doi:10.1155/2015/178564
Rosenthal NE. Winter Blues: Everything You Need to Know to Beat Seasonal Affective Disorder. New York, NY: Guilford Press; 2006.
Oi, eu sou Helena Lara. Eu sou psicóloga e moro aqui no Brasil, em São Paulo capital. Quem migrou foi meu filho, que se chama Guilherme. Eu não sei dizer exatamente qual foi a motivação dele de migrar, mas eu posso dizer o que foi que acentuou a vontade dele de ir embora. Desde que o Guilherme era pequeno, por exemplo, já com uns 7 anos de idade, ele dizia que ia embora para os Estados Unidos. Eu achei estranho no começo, porque nem na nossa família e nem no nosso grupo de amigos não tinha, na época, ninguém que tivesse migrado. Ele não tinha escutado relatos de migração de ninguém para poder se sentir encantado com isso. Como um apreciador de basquete, ele gostava muito de Michael Jordan. Isso e a vontade de jogar basquete acentuaram a vontade dele de ir para os Estados Unidos.
Quando ele entrou para o ginásio, eu o coloquei em um curso de inglês e ele amava, se dedicava bastante. Conhecia muito sobre os Estados Unidos e gostava de assistir programas americanos, até cobria as legendas para poder praticar melhor o idioma. Eu brincava, dizendo que ele tinha nascido no país errado. Com toda certeza, chegou um dia em que decidiu ir e foi.
Ele foi em 2014 e nós usamos as chamadas de vídeo para conversar. De certa forma, é gostoso, pois ele me mostra os lugares onde está, e eu posso conhecer um pouco da sua vida lá. Isso alivia muito! Eu sempre falava: no ano que vem vou vê-lo. Mesmo sem ter uma organização de fato para isso, sempre falava e isso me acalmava e aliviava a minha saudade. Meu filho faz falta. Ele é muito companheiro, inteligente, e eu acho muito bom conversar com os filhos, mas eu sei que ele está feliz. Ele me conta que se sente em casa lá. É bom escutar isso e não tem como não desejar que ele também siga com essa sensação de pertencimento!
A única coisa é que a saudade é forte, ela arrebenta com a gente. Após ele ir, em 2016, a saudade foi apertando de fato e foi muito interessante notar que, quando acordava, muitas vezes tinha a sensação que tinha havia abraçado ele, tocado nele. A minha filha Fernanda escutou este meu relato, ficou quietinha e me deu um saquinho de presente no dia das mães. Um saquinho bem leve: era uma bolsinha para passaporte com o dinheiro da passagem! Uau! Com este lindo presente dela e do meu genro, em 2017, nós três embarcamos e fizemos uma surpresa para o meu filho, com a ajuda da minha nora (que na época era namorada e hoje é a sua esposa!). Foi tão bom!
Quando ele veio para o Brasil foi tão gostoso também! Reunimos a nossa família, que é bem grandinha! Foi tão bom fazer o bolo que ele gosta, caprichar no café da manhã, ver ele no sofá, estar ali perto. É a coisa mais desejada do mundo! E ele também voltou quando a Fernanda se casou e foi muito importante para todos nós! A Fernanda falou que não se casaria se ele não estivesse aqui, porque ele é importante e próximo dela.
E ele também retribuiu a nossa surpresa, me fazendo outra junto com a Fernanda. Foi maravilhoso abrir a porta e vê-lo!
Ele foi o primeiro filho que saiu, foi meu primeiro sentimento de ninho vazio. E todas as vezes que conversava com a minha filha, que sempre teve um ótimo relacionamento com o irmão, terminamos falando que tínhamos a certeza que ele estava feliz, realizado. Isso trazia aconchego para nós!
A imigração dele foi muito desejada e ele faz tudo para dar certo, já conquistou o seu visto de trabalho. Ele quer ficar lá e eu imagino que vai ficar. Algumas pessoas me dizem “ele vai voltar”, talvez pensando que isso me consola, mas para mim está bem definido e claro, desde o dia que ele foi. Quando fui visitá-lo, vendo aquele país, eu mesmo falei para ele ficar lá. É um bom país para se desenvolver, inclusive no seu trabalho. Ele tem mais alcance nos aspectos que ele valoriza.
Eu admiro essa vontade dele de imigrar. Eu nunca tive essa determinação de mudar de país, mas pelo fato dele estar lá, eu penso ou brinco de tentar passar alguns meses. Não visualizo uma mudança, pois eu acho que ficaria dividida, porque tenho minha filha no Brasil. Se um dia ela e o meu genro se mudassem, talvez eu ficaria um tempinho com um, um tempinho com o outro. Quem sabe? Ainda tem a questão do idioma, que seria um pouco complicado. Acho que teria que ser algo forte para eu sair daqui do Brasil.
Nós conversamos há pouco tempo sobre a imigração dele e acho que, para quem imigra, o mais difícil é não estar perto nos momentos e datas importantes da família, como aniversários ou a perda de um familiar, por exemplo. São diversos os fatores que impedem a pessoa de estar rapidamente aqui. Porém, são escolhas em que se ganha em diversos aspectos e balanceia as perdas. Ele participa da forma que dá e que hoje é possível, como pelas chamadas de vídeo.
Eu desejo que tudo seja possível para ele, que tudo dê muito certo, aliás, já está dando! Ele se sente em casa lá e é bom vê-lo assim. Desejo também que ele viva feliz com a esposa dele, que é uma pessoa muito guerreira! Que continue a ser esse homem maravilhoso que ele é! E, se pudesse pedir mais, seria alguns netinhos gringos! Já pensou?
Nós do Continuidade agradecemos imensamente à Helena Lara, por nos presentear com o olhar e a história da sua família. Que vocês possam sentir o aconchego que sentimos daqui ao escutá-la e a ao ler as suas palavras! Vielen Dank, Helena! Obrigada! Thank you!
Aqui no site e no podcast, nós tecemos nossas “conversas” sobre como se desenvolve a migração a partir dos aspectos emocionais, de como a sentimos, a vivenciamos e caminhamos no novo país de acolhida. Os nossos passos podem ser largos, calmos ou temerosos. Muitas vezes, somos acompanhados por passos pequeninos, curiosos ou ressabiados: os passos das crianças que nos acompanham nesta nova trilha de línguas, costumes e gostos. E nós, preocupados em andar para frente, muitas vezes não percebemos como são estes movimentos das nossas crianças e os seus olhares. Hoje, vamos dar o palco a elas! Se aconchegue!
A percepção da criança da “nova casa” ou do lar que fala duas línguas e que se divide em voos emocionados para outro país onde parte da sua família está, pode ser construída e influenciada pela fase de desenvolvimento que ela se encontra (e da compreensão cognitiva e emocional que pode ser possível em cada idade), pelas características de personalidade que está se desenvolvendo (o jeitinho tão característico de cada um), pelas características familiares e pelos estilos parentais de educação (como são geralmente as condutas dos pais no dia a dia). Além disso, podemos somar outros ingredientes na nossa “poção mágica” da vida de migrante, que são os aspectos que motivaram a migração, as expectativas dos cuidadores das crianças frente ao novo país e como ele pode impactar na vida do filho, por exemplo, na possibilidade de uma melhor educação e no tão sonhado multilinguismo. Faltaram alguns ingredientes? Então vamos colocar a receptividade e as características do país de morada. Que poção e tanto!
Foto: Mauricio de Paula (Flickr)
Uma coisa é certa: essa poção será única para cada família e para cada fase em que se encontra. As crianças podem sentir ansiedade e estranhamento diante dessa combinação, de tantas mudanças ou frente à agitação dos adultos, que também estão se acostumando à nova sociedade e à própria tarefa de serem pais dessa criança que muda tanto (não é se reaprende a ser pai em cada fase?!). As crianças podem estranhar também os novos sons da língua e como é fazer amizades e brincar usando outras palavras e outros códigos sociais. E neste momento podem vir pedidos como “eu queria ir para a casa”, referindo-se ao país de origem, solicitações de ajuda com o idioma e com expressões emocionais de que algo incomoda ou mexe, como dificuldade para dormir, episódios de choro, de irritabilidade e uma maior necessidade de estar perto dos pais ou das pessoas que falam a língua materna. É preciso observar e construir o conhecimento sobre o que os comportamentos e as emoções estão dizendo sobre a sua criança e o que será que ela está precisando neste momento, como acolhimento, pisar no freio ou de um bom incentivo e também de boas parcerias com o entorno (com a escola, outros mães e pais e quem mais puder se juntar nesta rede de cuidado).
Por outro lado, as crianças podem nos relatar encantamentos com os seus olhos atentos e curiosos de quem observa, escuta e está construindo a sua forma de ver o mundo. Com os olhos menos embaçados que os nossos, elas podem nos apontar para constâncias das ruas que nunca percebemos, mesmo estando ali todos os dias. Podem gostar logo de cara de sabores novos e pedir para repeti-los com a maior carinha boa. Podem nos fazer falar com outras famílias de nacionalidades diferentes, porque as crianças resolveram espontaneamente que aquele era o momento de brincar (e de conhecer este mundo!).
E o que elas estão querendo dizer com as suas facilidades ou com suas inquietações? Preparem bem os ouvidos e os olhos, como se tivessem assistindo o ápice de uma peça de teatro, onde os nossos pequenos gigantes irão contracenar em grande e bom tom um manifesto: “ei, escutem a gente! Temos muito o que falar e somar! Sabemos de tanta coisa!”. E ousamos complementar e incentivar a importância de ouvir a voz da criança e dar a oportunidade dela nos contar o seu olhar! Nós podemos nos surpreender – e falamos aqui, com o sorriso no canto da boca, lembrando de situações sábias que eles nos ensinaram. Podemos incentivá-los, com isso, a se desenvolverem entrando em contato com as suas emoções, expressando-as, mesmo que de forma desajeitada (aliás, nós também fazemos muitas vezes assim, não é?!) e sentindo que têm voz e que são cuidadas, quando isso for preciso. É difícil, para eles e para nós – mas é um caminho tão promissor!
No próximo episódio, vamos dar o microfone às nossas crianças, para que elas possam contar a sua história de migração. O protagonismo será delas! E esperamos que aí, durante a conversa na sala de estar, na cozinha, antes de dormir ou no caminho para o supermercado, aconteça o compartilhar de sensações, emoções e pensamentos!
Escutamos com frequência o termo Saúde mental (SM), mas o que ela é de fato? É um conceito que abrange o nosso bem-estar subjetivo, a percepção de ser capaz de realizar as nossas atividades com autonomia e sentir realização no nosso potencial intelectual e emocional (OMS, 2001). Nada simples, não é? Isso quer dizer que, para a gente se sentir bem, temos que olhar e cuidar de muitos conteúdos nossos.
A Saúde Mental é tão importante que a Organização Mundial da Saúde (aquela organização que orienta o mundo inteiro sobre como preservar e cuidar da saúde dos seus cidadãos), nos diz que “a saúde mental, a saúde física e a social são fios da vida estreitamente entrelaçados e profundamente interdependentes” (Relatório da SM, 2001). Ela ainda dedicou este mês de setembro como um período importante de divulgação de informações e sensibilização sobre a SM.
E como a nossa saúde mental é constituída? Você vai cair da cadeira ao ver quantos elementos influenciam a nossa forma de ver e sentir o mundo! Novamente, vamos chamar alguém bem gabaritado para nos ajudar: a Organização Panamericana de Saúde (OPAS).
“Os determinantes da saúde mental e transtornos mentais incluem não apenas atributos individuais, como a capacidade de administrar os pensamentos, as emoções, os comportamentos e as interações com os outros, mas também os fatores sociais, culturais, econômicos, políticos e ambientais, como as políticas nacionais, a proteção social, padrões de vida, as condições de trabalho e o apoio comunitário.”
Organização Panamericana de Saúde (OPAS)
Acredito que você, lendo aí, pensou nos últimos acontecimentos estressantes que tivemos: pandemia, políticas controversas, situações de discriminação e racismo, de insegurança, e muitas outras situações.
O importante, desafiador e, talvez possamos dizer, o mais bonito dessa história toda é que cada um precisará (re)conhecer como a sua própria Saúde Mental funciona: quais os gatilhos para ela não andar bem, quais os cuidados que funcionam para cada um e quais os sinais de que as coisas estão indo bem ou não. Por exemplo, quando percebemos que estamos desatentos, não dormindo bem, irritados demais, sentindo mais ou menos apetite, o quanto estamos disponíveis ou não para contatos interpessoais, como anda a nossa motivação nas nossas atividades e como estamos nos cuidando.
Tudo isso pode ganhar uma complexidade ainda maior na migração, quando não dispomos de forma tão acessível dos recursos que conhecíamos e tínhamos segurança, como a rede de apoio e a confiança na própria identidade, que estão sendo reconstruídos no novo lugar de moradia. Desta forma, a migração pode ser um fator que pode impactar negativamente a SM, uma vez que traz novos desafios em um novo terreno, onde estamos nos reconhecendo (quem sou e quais recursos trago comigo?).
Neste percurso, podemos levantar alguns pontos importantes:
O refinamento a cada dia do autoconhecimento, para saber a sua forma e o seu tempo de construir a sua história de migração;
A identificação do que me faz bem ou não (e isso pode partir da observação de coisas muito simples no dia a dia);
A busca de conexões com aspectos importantes para cada um na nova terra. Por exemplo, os valores de vida e as atividades que são essenciais ou prazerosos para que, “enquanto o amanhã não vem” (seja na língua, com novos amigos, nonovo trabalho), exista muita vida – prática e emocional – acontecendo;
A construção de limites para se preservar, por exemplo, na comunicação com as pessoas próximas e no quanto aceita de fato fazer ou não algo;
O reconhecimento e construção de uma boa rede de suporte, descobrindo com quem contar e em qual momento;
Psicoterapia, contando com ajuda de um profissional para falar e cuidar do que dói,
Grupos de suporte, com outras pessoas que estão passando pela mesma situação, como grupos de pais, de pessoas que tem o mesmo diagnóstico, de leituras, dentre outros.
Práticas de meditação, que buscam conectar com o “aqui e agora”, participando do reconhecimento do próprio corpo, da respiração e por aí vai.
Acesso a conteúdo construtivos, como, por exemplo, cursos, estudos sobre comunicação não violenta, relatos de outras pessoas, vídeos e podcasts de seu interesse.
E muitas outras estratégias que você pode descobrir!
Lembre-se que não precisamos resolver tudo, muito menos caminhar sozinhos. Bons cuidados aí!
Continue nos acompanhando, que, neste mês, iremos publicar alguns conteúdos sobre esta temática.
Saudade de imigrante é assim, não tem hora para bater e, às vezes, vem em horas tão inesperadas… quando se vê uma estampa colorida, um cheiro, um gosto “que parece com”, alguém que pergunta de onde você é e, de repente, de algo de lá que conhece. Ou então quando lembramos de quem “se era” no país de origem, tanto nos laços afetivos, na rotina como na identidade profissional.
Ela vem quando é uma data super querida e nossa família liga com a mesa farta e mostra quem está ao seu redor.
Ela vem quando os sobrinhos questionam “tia, quando é que você vem?”.
Ela nos visita quando estamos diante de situações desafiadoras do lado de cá e a gente pensa “ah, eu só queria estar no aconchego da minha língua, dos meus pares”.
A saudade também nos traz, por outro lado, um gosto maravilhoso quando a gente revê quem amamos. Ela também nos movimenta para achar jeitos de estar presente, mesmo com muitos quilômetros de distância. Isso pode ser feito com chamadas de vídeo para conversar, para mostrarmos a eles a neve ou para eles nos mostrarem a praia. Pode ser por mensagens, por cartas, pelas encomendas que amigos levam para as pessoas que amamos e que trazem para a gente matar saudade.
E a música “Sonho Meu”, de Delcio Carvalho e Yvonne Lara, retrata bem esse desejo de estar onde se está, mesmo sem perder a vontade de ir para perto dos nossos conterrâneos, do sol, de lugares e atividades que gostamos.
“Sonho meu, sonho meu
Vá buscar quem mora longe
Sonho meu
Sonho meu, sonho meu
Vá buscar quem mora longe
Sonho meu
Vá mostrar essa saudade
Sonho meu
Com a sua liberdade
Sonho meu”
Vá, sonho meu, “com a sua liberdade”, una esses dois lares que temos e as dualidades dos nossos sentimentos! Por favor, nos ensine a trazer um pouco de Brasil nas músicas que ouvimos em casa, nas receitas que aprendemos, nas corridas dos mercadinhos típicos e nas intermináveis conversas lá com o Brasil ou com os nossos conterrâneos que vivem aqui. E, sonho meu, traga aquele sorriso de canto de boca de quando a gente arruma a mala – cheia de lembrancinhas – com destino a Guarulhos. Ah, sonho meu, “traz a pureza de um samba / Sentido, marcado de mágoas de amor / Samba que mexe o corpo da gente/ Vento vadio embalando a flor”.
Nesta semana comemoramos o Dia Internacional das Mulheres. Além das famosas rosas que são entregues nesta data, este dia nos lembra a luta de muitas mulheres que vieram antes de nós, as dores, os avanços e os papéis que podemos e queremos desempenhar, inclusive na imigração.
O dia 08 de março relembra a luta de mulheres operárias, que antes tinham poucas possibilidades de ter um papel social e laboral fora de casa. Quando elas foram para as fábricas, se depararam com horas exaustivas de trabalho e condições muito precárias para exercê-lo. Ao reivindicarem melhorias e direitos, tiveram uma forte resistência, inclusive com uma represália que causou a morte de muitas delas. Esse fato tornou a data um dia mundial de lembrar as lutas que tanto desejamos e o quão necessárias elas são.
Tiveram lutas antes, como por exemplo, de ter concepções ou habilidades diferentes, e serem consideradas “bruxas” ou “loucas”. Depois disso, tiveram que lutar para votar (e em alguns lugares, isso é um direito recente ou ainda não é concedido), de escolherem seus rumos sobre os relacionamentos, sobre ter filhos (quando e se querem tê-los), de serem aquelas que dizem o que pode ou não ser feito com os seus corpos (e serem escutadas) e de desejarem ser quem quiserem (e da forma que quiserem).
Huelga Feminista Madrid, 8 de Março de 2020 | Foto: Lali Souza
Nestas mudanças, desejos, dores e lutas, muito foi conquistado, embora ainda tenhamos muito de construir em um caminho de mais equidade nas empresas, na política e em casa, no respeito e na diminuição dos índices de violência contra a mulher. Enquanto isso somamos a este turbilhão de sentimentos, desejos e realidade, as representações sobre o que é ser mulher, que fomos aprendendo desde o que era falado e autorizado nas nossas famílias de origem e nas nossas comunidades, e o que aprendemos em seguida nos diversos grupos que participamos. Inclusive no contato com uma nova cultura, no caso da imigração.
A imigração pode trazer formas diferentes de ver o ser mulher, se comparado com o país de origem, com ampliação dos direitos ou ainda mais restrições. A vida no interior da casa também pode ser alterada, quando, por exemplo, um do casal vem empregado e o outro precisa construir habilidades com a língua e validar a sua experiência profissional, para se inserir no mercado de trabalho ou nos estudos no novo país. E isso sem contar com as redes de suporte que antes conhecia. Neste momento, pode vir o medo de estar “dando passos para atrás” ao ser “responsável” pelas casas e pelos filhos ou não ter atividade remunerada. E isso é ser menos mulher?
Nós, aqui, consideramos que ser mulher autêntica é ser a mulher que lhe faz sentido, que cabe ao seu momento e que pode ser tão valioso como ser nomeada CEO de uma empresa. Por exemplo, se a escolha é desprender os esforços em cuidar do seu filho, que representa cuidar de um novo cidadão ou nova cidadã, isso não é um papel e tanto? Dar um tempo para se adaptar no novo país, considerando as condições financeiras da família, também pode ser uma opção de respeito consigo. E muitos outros exemplos que vocês e nós poderíamos citar aqui, sem julgamento ou avaliando com olhos de quem classifica o que é válido ou vale mais.
As lutas feministas aconteceram e acontecem para que o poder de escolha seja real, validado e autêntico para cada um. E é isso que desejamos a nós todas neste dia: que a gente continue caminhando, pessoalmente e como comunidade, para garantir o direito de ser quem se é e da forma que desejar, e ser respeitada (e respeitar). Que todas nós possamos completar a nossa apresentação “brasileira (ou do país que for), imigrante e …” com tranquilidade e sendo acolhida e valorizada da forma que somos (inclusive por nós mesmas).
Em muitos países para onde migramos, não é possível começar a trabalhar imediatamente por vários motivos. Muitas vezes, o novo país tem uma língua oficial diferente da nossa e as oportunidades de trabalho podem ser fortemente ligadas ao domínio do idioma local. Em muitos casos, também, nossos diplomas e qualificações do país de origem precisam passar por um processo de reconhecimento oficial antes que possamos, realmente, nos aventurarmos na busca de emprego. Além de tudo isso, outras vezes ainda precisamos esperar sair algum tipo de autorização de trabalho.
Todos esses processos, por serem muito burocráticos, podem demandar bastante tempo, o que acaba se tornando um grande desafio para a pessoa imigrante: ter paciência para esperar as coisas acontecerem. Isso pode ser ainda mais difícil para pessoas que migram em busca de melhores condições de trabalho, de carreira ou de estudos.
Sabemos que essa espera pode ser angustiante. Muita gente fica com a impressão de estar “parada” no tempo. Uma forma de controlar essa ansiedade é tentar uma mudança de perspectiva e lançar o olhar para uma série de coisas que podemos fazer enquanto esperamos.
Neste texto, trazemos algumas sugestões do que fazer enquanto as situações burocráticas ainda não se resolveram. Eperamos que, com isso, possamos dar uma controlada na sensação de estagnação que essa fase da migração pode gerar.
Existe uma oferta infinita de cursos online que podemos aproveitar. Muitos até são gratuitos! Enquanto a gente espera nosso visto sair, é possível nos especializarmos, mudar o foco e aprender coisas novas. A oferta é tão ampla que, hoje em dia, a maior dificuldade é escolher que curso fazer. A plataforma Coursera, por exemplo, tem centenas de cursos em parceria com diversas universidades internacionais, nas mais diversas áreas do conhecimento. Você pode fazer os cursos simplesmente para ampliar seus conhecimentos, como também para receber um certificado. Vale a pena dar uma olhada em seu catálogo.
– Faça algum trabalho voluntário.
Você sempre pensou em se enagajar em alguma causa social ou política e nunca teve tempo? Enquanto você espera seu visto sair, pode ser o momento perfeito para você fazer isso. Além de te dar um outro foco, isso vai te proporcionar vivências e uma oportunidade valiosa de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. Busque associações, ONGS e causas locais para se engajar. A experiência é valiosa e ainda é uma forma de você entrar em contato com a comunidade que te acolhe e de criar vínculos no novo país.
– Aprenda a língua local ou algum outro idioma.
Aprender a língua local pode ser um desafio importante, que possibilitará maior independência e uma participação na vida da cidade de forma mais ampla. Além disso, nos próprios cursos que você fizer, pode conhecer outras pessoas e histórias de migração e, assim, constituir os seus primeiros vínculos no novo local. Isso também vai te ajudar a ampliar a perspectiva sobre os desafios e desejos que te conectam com o lugar onde você está.
– Conheça a cultura local.
Nos nossos novos lugares, podemos lançar um olhar atento a como são os hábitos, os valores e costumes locais. Podemos fazer descobertas belas e inusitada! Por exemplo, em Hamburgo, saber que todo sábado tem uma das maiores feirinhas de orgânicos do mundo debaixo de um viaduto (Isemarkt) ou então que uma comida de rua super típica da cidade é um sanduíche de peixe cru, com pele e tudo (Fischbrötchen)!
Isemarkt. Foto: MarekSanten
Fischbrötchen. Foto: congerdesign por Pixabay
Sorrir e se surpreender ao conhecer o diferente ou reconhecer semelhanças podem ajudar a aumentar a sensação de pertencimento por perceber onde se está (e quando ligar para familiares ou receber amigos, poder contar “onde eu moro é assim”).
Aproveite para passear, visitar museus, andar por aí sem destino admirando as paisagens. Assim que o seu visto sair, a situação pode mudar e esses momentos de simples conexão com o lugar, um dia-a-dia leve, podem se tornar raros.
Esperamos que essas dicas sirvam de inspiração para vocês. No entanto, precisamos relembrar da dica mais importante de todas: tenha paciência.
O fato de que é possível ocupar nosso tempo com atividades diferentes como forma de controlar nossa ansiedade, não significa que a gente deva fazer isso o tempo todo. Lembre-se de que, na primeira fase da migração, essa pressão que sentimos para absorver tudo e a necessidade de nos ocuparmos o tempo inteiro é real. Porém, nossa psique também precisa de um descanso e espaço livre para se organizar. O ideal é encontrar um equilíbrio: nos mantermos em atividade, mas também preservarmos um espaço para deixar que as coisas aconteçam em seu tempo.
Neste processo de esperar por algo que não está nas nossas mãos, podemos sentir receio de não dar certo. Por isso, pode ser difícil nos envolvermos em novas atividades e relacionamentos, além de sermos guiados pela premissa: “depois que der certo, eu vou…”. Isso pode ser uma condicional dura e que inviabiliza apreciar e valorizar os pequenos passos diários de descobertas e superações.
Dito isto, finalizamos esse texto com um trecho que Guimarães Rosa escreveu em seu último livro publicado em vida: “a felicidade se acha em horas de descuido”. Durante a espera, pode haver vida, conexão, esperança e a brincadeira. Aproveite cada instante!