Crianças Migrantes

Aqui no site e no podcast, nós tecemos nossas “conversas” sobre como se desenvolve a migração a partir dos aspectos emocionais, de como a sentimos, a vivenciamos e caminhamos no novo país de acolhida. Os nossos passos podem ser largos, calmos ou temerosos. Muitas vezes, somos acompanhados por passos pequeninos, curiosos ou ressabiados: os passos das crianças que nos acompanham nesta nova trilha de línguas, costumes e gostos. E nós, preocupados em andar para frente, muitas vezes não percebemos como são estes movimentos das nossas crianças e os seus olhares. Hoje, vamos dar o palco a elas! Se aconchegue!

A percepção da criança da “nova casa” ou do lar que fala duas línguas e que se divide em voos emocionados para outro país onde parte da sua família está, pode ser construída e influenciada pela fase de desenvolvimento que ela se encontra (e da compreensão cognitiva e emocional que pode ser possível em cada idade), pelas características de personalidade que está se desenvolvendo (o jeitinho tão característico de cada um), pelas características familiares e pelos estilos parentais de educação (como são geralmente as condutas dos pais no dia a dia). Além disso, podemos somar outros ingredientes na nossa “poção mágica” da vida de migrante, que são os aspectos que motivaram a migração, as expectativas dos cuidadores das crianças frente ao novo país e como ele pode impactar na vida do filho, por exemplo, na possibilidade de uma melhor educação e no tão sonhado multilinguismo. Faltaram alguns ingredientes? Então vamos colocar a receptividade e as características do país de morada. Que poção e tanto!

Foto: Mauricio de Paula (Flickr)

Uma coisa é certa: essa poção será única para cada família e para cada fase em que se encontra. As crianças podem sentir ansiedade e estranhamento diante dessa combinação, de tantas mudanças ou frente à agitação dos adultos, que também estão se acostumando à nova sociedade e à própria tarefa de serem pais dessa criança que muda tanto (não é se reaprende a ser pai em cada fase?!). As crianças podem estranhar também os novos sons da língua e como é fazer amizades e brincar usando outras palavras e outros códigos sociais. E neste momento podem vir pedidos como “eu queria ir para a casa”, referindo-se ao país de origem, solicitações de ajuda com o idioma e com expressões emocionais de que algo incomoda ou mexe, como dificuldade para dormir, episódios de choro, de irritabilidade e uma maior necessidade de estar perto dos pais ou das pessoas que falam a língua materna. É preciso observar e construir o conhecimento sobre o que os comportamentos e as emoções estão dizendo sobre a sua criança e o que será que ela está precisando neste momento, como acolhimento, pisar no freio ou de um bom incentivo e também de boas parcerias com o entorno (com a escola, outros mães e pais e quem mais puder se juntar nesta rede de cuidado). 

Por outro lado, as crianças podem nos relatar encantamentos com os seus olhos atentos e curiosos de quem observa, escuta e está construindo a sua forma de ver o mundo. Com os olhos menos embaçados que os nossos, elas podem nos apontar para constâncias das ruas que nunca percebemos, mesmo estando ali todos os dias. Podem gostar logo de cara de sabores novos e pedir para repeti-los com a maior carinha boa. Podem nos fazer falar com outras famílias de nacionalidades diferentes, porque as crianças resolveram espontaneamente que aquele era o momento de brincar (e de conhecer este mundo!). 

E o que elas estão querendo dizer com as suas facilidades ou com suas inquietações? Preparem bem os ouvidos e os olhos, como se tivessem assistindo o ápice de uma peça de teatro, onde os nossos pequenos gigantes irão contracenar em grande e bom tom um manifesto: “ei, escutem a gente! Temos muito o que falar e somar! Sabemos de tanta coisa!”. E ousamos complementar e incentivar a importância de ouvir a voz da criança e dar a oportunidade dela nos contar o seu olhar! Nós podemos nos surpreender – e falamos aqui, com o sorriso no canto da boca, lembrando de situações sábias que eles nos ensinaram. Podemos incentivá-los, com isso, a se desenvolverem entrando em contato com as suas emoções, expressando-as, mesmo que de forma desajeitada (aliás, nós também fazemos muitas vezes assim, não é?!) e sentindo que têm voz e que são cuidadas, quando isso for preciso. É difícil, para eles e para nós – mas é um caminho tão promissor! 

No próximo episódio, vamos dar o microfone às nossas crianças, para que elas possam contar a sua história de migração. O protagonismo será delas! E esperamos que aí, durante a conversa na sala de estar, na cozinha, antes de dormir ou no caminho para o supermercado, aconteça o compartilhar de sensações, emoções e pensamentos! 

“Água é uma gota de chuva

É uma gota de nuvem

É uma gota de água para viver”

(Palavra Cantada – De Gotinha em gotinha) 

Por Daniele Stivanin

Imagem de destaque: GraceOda_ (Flickr)

Você está cuidando de sua saúde mental?

Escutamos com frequência o termo Saúde mental (SM), mas o que ela é de fato? É um conceito que abrange o nosso bem-estar subjetivo, a percepção de ser capaz de realizar as nossas atividades com autonomia e sentir realização no nosso potencial intelectual e emocional (OMS, 2001).  Nada simples, não é? Isso quer dizer que, para a gente se sentir bem, temos que olhar e cuidar de muitos conteúdos nossos.

A Saúde Mental é tão importante que a Organização Mundial da Saúde (aquela organização que orienta o mundo inteiro sobre como preservar e cuidar da saúde dos seus cidadãos), nos diz que “a saúde mental, a saúde física e a social são fios da vida estreitamente entrelaçados e profundamente interdependentes” (Relatório da SM, 2001). Ela ainda dedicou este mês de setembro como um período importante de divulgação de informações e sensibilização sobre a SM.

            E como a nossa saúde mental é constituída? Você vai cair da cadeira ao ver quantos elementos influenciam a nossa forma de ver e sentir o mundo! Novamente, vamos chamar alguém bem gabaritado para nos ajudar: a Organização Panamericana de Saúde (OPAS).

“Os determinantes da saúde mental e transtornos mentais incluem não apenas atributos individuais, como a capacidade de administrar os pensamentos, as emoções, os comportamentos e as interações com os outros, mas também os fatores sociais, culturais, econômicos, políticos e ambientais, como as políticas nacionais, a proteção social, padrões de vida, as condições de trabalho e o apoio comunitário.”

Organização Panamericana de Saúde (OPAS)

           

Acredito que você, lendo aí, pensou nos últimos acontecimentos estressantes que tivemos: pandemia, políticas controversas, situações de discriminação e racismo, de insegurança, e muitas outras situações.

O importante, desafiador e, talvez possamos dizer, o mais bonito dessa história toda é que cada um precisará (re)conhecer como a sua própria Saúde Mental funciona: quais os gatilhos para ela não andar bem, quais os cuidados que funcionam para cada um e quais os sinais de que as coisas estão indo bem ou não. Por exemplo, quando percebemos que estamos desatentos, não dormindo bem, irritados demais, sentindo mais ou menos apetite, o quanto estamos disponíveis ou não para contatos interpessoais, como anda a nossa motivação nas nossas atividades e como estamos nos cuidando.

Tudo isso pode ganhar uma complexidade ainda maior na migração, quando não dispomos de forma tão acessível dos recursos que conhecíamos e tínhamos segurança, como a rede de apoio e a confiança na própria identidade, que estão sendo reconstruídos no novo lugar de moradia. Desta forma, a migração pode ser um fator que pode impactar negativamente a SM, uma vez que traz novos desafios em um novo terreno, onde estamos nos reconhecendo (quem sou e quais recursos trago comigo?).  

Neste percurso, podemos levantar alguns pontos importantes:

  • O refinamento a cada dia do autoconhecimento, para saber a sua forma e o seu tempo de construir a sua história de migração;
  • A identificação do que me faz bem ou não (e isso pode partir da observação de coisas muito simples no dia a dia);
  • A busca de conexões com aspectos importantes para cada um na nova terra. Por exemplo, os valores de vida e as atividades que são essenciais ou prazerosos para que, “enquanto o amanhã não vem” (seja na língua, com novos amigos, nonovo trabalho), exista muita vida – prática e emocional – acontecendo;
  • A construção de limites para se preservar, por exemplo, na comunicação com as pessoas próximas e no quanto aceita de fato fazer ou não algo;
  • O reconhecimento e construção de uma boa rede de suporte, descobrindo com quem contar e em qual momento;
  • Psicoterapia, contando com ajuda de um profissional para falar e cuidar do que dói,
  • Grupos de suporte, com outras pessoas que estão passando pela mesma situação, como grupos de pais, de pessoas que tem o mesmo diagnóstico, de leituras, dentre outros.
  • Práticas de meditação, que buscam conectar com o “aqui e agora”, participando do reconhecimento do próprio corpo, da respiração e por aí vai.
  • Acesso a conteúdo construtivos, como, por exemplo, cursos, estudos sobre comunicação não violenta, relatos de outras pessoas, vídeos e podcasts de seu interesse.
  • E muitas outras estratégias que você pode descobrir!

Lembre-se que não precisamos resolver tudo, muito menos caminhar sozinhos. Bons cuidados aí!

Continue nos acompanhando, que, neste mês, iremos publicar alguns conteúdos sobre esta temática.

Por Daniele Stivanin

Referencias:

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE . Relatório sobre a saúde no mundo 2001: Saúde mental: nova concepção, nova esperança. Genebra: OPAS/OMS, p.1-16, 2001.

https://www.paho.org/pt/topics

Foto de destaque: joseba_p_flickr

Mulheres Migrantes: Rupi Kaur

A escritora e poetisa Rupi Kaur nos inspira, não somente pelo seu trabalho, mas pela força com que defende as mulheres e os nossos direitos. Hoje, aproveitamos esse espaço para falar um pouco sobre ela, sua história de migração toda a luta que representa.

Rupi Kaur cresceu no Canadá, onde foi morar com sua família quando ainda tinha 4 anos. Ela nasceu na Índia, na cidade de Panjabe. Dentro do Canadá, chegou a morar em várias cidades diferentes e, hoje, tem residência em Brampton, na província de Ontario.

A sua hstória com as palavras e a literatura começou desde muito nova. Em entrevista ao site El Mundo, ela conta que escrever foi a sua forma de se libertar das dores que sentia por ser uma criança tímida e solitária, que era perseguida na escola.

O seu refúgio saiu do papel e ganhou o mundo online. Foi através de textos publicados em redes sociais que Rupi se tornou conhecida, principalmente pelo cunho feminista de suas palavras. Ela ganhou vizibilidade internacional quando, em 2015, uma fotos publicadas no Instagram, na qual aparece deitada e com a roupa manchada de menstruação, foi excluída duas vezes pela plataforma. A revolta de Rupi viralizou – e a imagem também – resultando na recuperação do post, acompanhado de um pedido de desculpas por parte do Instagram.

Imagem: Rupi Kaur

Rupi Kaur publicou o seu primeiro livro também em 2015: Outros jeitos de usar a boca (título original: Milk and Honey). A antologia fala sobre feminilidade, suas dores, abusos e capacidade de sobrevivência. Ela vendou mais 8 milhões de cópias e foi traduzida para 42 idiomas.

Despois do sucesso do primeiro, a autora já lançou mais dois livros: O que o Sol faz com as flores e Home Body.

Sobre ser uma pessoa imigrante, Rupi Kaur é gente como a gente e destaca que as suas dores são bem comuns àqueles que saem muito novos do seu país de origem. Ela se vê como uma pessoa de duas culturas, não perdeu a sua origem e está muito bem integrada ao local de acolhida. Por isso, diz que que “casa é um conceito complicado”.

“Aqui no Canadá, eles me olham e me veem de forma diferente, não me reconhecem como um deles, porque minha pele escura não se encaixa nos cânones ocidentais. Mas na Índia a mesma coisa acontece comigo, eles também me veem como uma estranha.”

Rupi Kaur em entrevista ao El Mundo, 2017.

*Por Lali Souza

Imagem de destaque: Rupi Kaur Oficial

Fontes:

Rupi Kaur – site otifical
Wikipedia
Fala Universidades
El Mundo

Pausa para cuidar da família

Um dos maiores fantasmas da vida da pessoa que migra é como lidar com situações de urgência com a família no país de origem. O pensamento de que algo pode vir a acontecer a nossos pais e familiares quando estamos longe, sem que tenhamos a possibilidade de rapidamente estar perto deles, acompanha a vida de muitas pessoas migrantes como uma espécie de sombra constante em todos os momentos da vida fora de nosso país de origem. Todas nós, pessoas migrantes, aceitamos a possibilidade de não podermos estar presentes em momentos decisivos das vidas de nossos familiares e amigos. Temos ciência de que não participaremos de todos os aniversários, nascimentos, formaturas e que talvez, ao chegarmos, seja tarde demais para um último adeus.

Por isso, para a pessoa que migra, ter a possibilidade de voltar para o país de origem quando se tem vontade, saudade ou quando alguma emergência exige, é uma grande oportunidade que a maioria de nós agarra mesmo, sem titubear. Recentemente, o Continuidade se viu diante de uma dessas situações. O que fazer quando uma pessoa da família está gravemente doente e precisa de nós? Essas situações geralmente nos pegam de surpresa e, na migração, a surpresa vem acompanhada da pressão do tempo.

Durante uma pandemia, então, é a pressão do tempo mais as incertezas relacionadas a todo o resto. De repente, tudo fica urgente e a pessoa migrante trava uma corrida contra o tempo para organizar a burocracia e encarar uma viagem de volta ao país de origem, dessa vez deixando para trás as pessoas no país de acolhida para se reorganizarem com a lacuna súbita que foi deixada. Grande parte da vida de migrante consiste em administrar as ausências e faltas.

Pedimos compreensão com esse nosso momento de lidar com a lacuna repentina deixada por Cris, que teve de encarar essa turbulenta e incerta viagem de volta ao Brasil para estar perto de sua mãe que está internada com COVID. Nós, que desta vez somos a família que ficou, estamos aqui nos reorganizando para poder, em breve, voltar a produzir conteúdo para vocês.

*Por Cris Oliveira

Imagem de destaque: Free Foto by Pixabay

História de Migração: Stela Zaleski

Olá, eu sou a Stela, tenho 35 anos e nasci em um dos lugares mais lindos do mundo: Maceió, Alagoas, Brasil.

Aos 17 anos vim morar na Alemanha, que era meu sonho desde quando estive aqui pela primeira vez, com 7 aninhos. Com 12 anos, vim mais uma vez visitar o país que se tornaria um dia meu lar. Minha mãe já tinha vindo quase 2 anos antes de mim para morar. Quando ela veio, eu fiquei no Brasil pra concluir a escola e vir logo depois.

Chegando aqui tive duas experiências que me marcaram muito. Primeiro, que apesar da minha mãe viver e estar casada na Alemanha, eu não tive direito a um visto permanente. Durante um ano, ia a cada três meses buscar um visto de turista, sempre com medo de não receber e ser mandada de volta. Não queria ficar mais longe da minha mãe. Outra coisa que também foi muito difícil foi não ter amigos e não me sentir pertencente a um grupo.

Bom, tudo isso passou. Consegui, então, um visto de um ano, fiz estágios em dois lugares. No meu primeiro estágio, percebi bem rápido que não era minha praia. Já no segundo, logo vi que adorava trabalhar com gente. Isso é mais a minha cara. E assim foi. Fiz um ano de estágio e fui contratada pra fazer um “Ausbildung” (curso profissionalizante) que tinha duração de três anos. Com isso, consegui mais três anos de visto e eu sabia também que, se depois eu fosse contratada, tendo um emprego fixo, poderia ficar.

A minha primeira amiga aqui na Alemanha foi e é minha irmã e comadre também, Cris Oliveira. Fizemos amizade muito rápido no curso de alemão, mas lá ainda não sabíamos que nos tornaríamos irmãs 😘. Nossa história é um caso à parte. Fazer amigos aqui na Alemanha não foi nada fácil e se sentir pertencente a um grupo, diria que “danou-se”.

Depois de doze anos vivendo aqui, frequentando festas que minha comadre sempre me levava, e onde normalmente também estavam as mesmas pessoas, ainda assim não conseguia fazer conexões para além das festas, apesar de me dar bem com todo mundo. Pelo menos era o que sentia. Até que um dia abri meu e-mail e vi um convite pessoal de um deles me chamando para ir a uma festa na sua casa (onde provavelmente eu iria sem convite mesmo, levada por minha comadre🤣🤣🤣).

Como já falei, eu provavelmente iria de qualquer jeito, mas ter sido convidada daquela forma me deu uma sensação de ser pertencente a um grupo. Não sei explicar exatamente porque, mas essa experiência particularmente me marcou bastante.

Toda minha história aqui, na verdade, me enche de orgulho. Cheguei, tive alguns probleminhas com meu visto e o fato de não ter meus amigos por perto. Na época também não existia WhatsApp, Skype e etc. Isso teria facilitado bastante a minha vida. Conheci meu namorado assim que cheguei na Alemanha. Com ele, casei, tive três filhos, construímos uma casa e durante quatorze anos fomos um casal.

Durante todo esse tempo, eu fui e fiz diversas coisas aqui. Em 2016, passei a trabalhar como autônoma. Foi bom enquanto durou e ano passado resolvi, a princípio, parar com um pequeno salão de estética no qual eu atendia. Em 2017 um novo capítulo se iniciou na minha vida. Me separei, e agora dou outros rumos à minha vida.

Só posso dizer que fui e sou muito feliz aqui. Continuo morando com meus 3 pequenos homens na casa em que construí com o pai deles e isso facilita minha vida em vários aspectos. O que mais me alegra é ter a certeza de que, mesmo vivendo num país que não é o meu de origem, hoje sei que existiu e existem pessoas deste país que sempre me ajudaram a construir minha história aqui. E eu sou muito grata a cada uma delas.😉

No momento, imagino várias coisas para meu futuro, porém nada ainda muito concreto. Tenho vontade de voltar a estudar, mas no momento isso ainda não tem como se tornar uma prioridade.

Se meu filhos resolvessem migrar um dia, eu acho que eu diria a eles pra terem paciência e a correrem atrás daquilo que querem conquistar ao mesmo tempo. Que dominar o idioma do lugar escolhido é quase que um grito de independência e que eles não devem se concentrar em um único caminho, pois, como sabemos, vários caminhos nos levam a Roma. Diria que também respeitem os valores do lugar escolhido para migrar.

A primeira coisa que eu faço quando volto de férias a meu país de origem é comer, comer e comer. 😂 Isso, além de visitar lugares que me trazem algumas boas recordações, com pessoas que fazem parte da história. 😉 Apesar de ser dificil de eleger o que há de melhor para fazer em Maceió, uma coisa é certa: vai ter praia no roteiro. Tem muitos lugares lindos como as dunas de Marapé, a praia de Paripoeira, as piscinas naturais da Pajuçara, a praia do Francês, a Barra de São Miguel, a Praia do Gunga, São Miguel dos Milagres, Maragogi, a Foz do Rio São Francisco e os Cânions do Rio São Francisco. Esses lugares são lindos demais, e tem praias pra todo gosto. Sem falar nas comidas, que são de comer rezando. 😂

Se eu pudesse voltar no tempo para o dia em que resolvi migrar pela primeira vez, os conselhos que eu diria para mim mesma seriam: aprenda a língua do lugar o mais rápido que você puder, não se desespere, tenha paciência, vá com calma, mas vá em frente. Mas também pare, respire fundo e deixe fluir aquilo que não está sob o seu controle.

Daqui a dez anos eu quero estar falando inglês fluentemente, para poder me comunicar por onde eu passar. Pretendo passear por muito lugares do mundo, mas sempre voltar pra casa, a Alemanha. 😉 Eu acho que ter vivido no Brasil e depois ter vindo pra cá foi uma das melhores experiências que eu poderia ter. Construí uma base sólida e aprendi muitas coisas com essas duas culturas.

Eu sou Stela Zaleski e essa é a minha história de migração. Qual é a sua?

*Por Stela Zaleski

Canções de Migração: Na Volta Que o Mundo Dá

A canção Na Volta Que o Mundo Dá, que conhecemos na voz da cantora Vânia Abreu, parece ter sido feita para o Continuidade. A letra é linda e faz quase que um resumo das fases da migração, das quais a gente tanto falou nos primeiros episódios do nosso podcast.

A música retrata uma migração voluntária e começa falando daquele sentimento que, muitas vezes, não sabemos muito bem de onde vem. É aquele “chamado”, uma vontade de experimentar viver em outro lugar.

Um dia eu senti um desejo profundo

De me aventurar nesse mundo

Pra ver onde o mundo vai dar

Ao chegar no destino, é comum vivermos uma euforia deliciosa com as novas experiências. O novo pode ser bastante sedutor e a sensação de realizar um sonho é mesmo muito gostosa.

Pisei muito porto de língua estrangeira

Amei muita moça solteira

Fiz muita cantiga por lá

Varei cordilheira, geleira e deserto

O mundo pra mim ficou perto

E a terra parou de rodar

Passada a euforia inicial, vêm as dificuldades. É quando a realidade bate na porta e, muitas vezes, traz consigo a vontade de voltar para o que nos é familiar. Nesta fase, sempre alertamos sobre a importância de ter atenção aos nossos sentimentos e de buscar ajuda, se necessário. Mesmo que a tristeza seja algo normal e parte da vida, lembre-se que você não precisa enfrentar o mundo sozinha(o).

Com o tempo

Foi dando uma coisa em meu peito

Um aperto difícil da gente explicar

Saudade, não sei bem de quê

Tristeza, não sei bem por que

Vontade até sem querer de chorar

O luto na migração, como já vimos, pode vir de muitas formas. A dor de se sentir não pertencente a lugar nenhum pode ser uma delas. A gente fica meio perdido porque ainda não se sente em casa no país de acolhida, mas também percebe que já não se encaixa no lugar de onde viemos.

Angústia de não se entender

Um tédio que a gente nem crê

Anseio de tudo esquecer e voltar

Com o tempo (e com ajuda!) a gente espera que essas dores melhorem e que a gente possa, finalmente, chamar de lar o lugar onde escolhemos viver. Mesmo que esse lugar seja o mundo inteiro.

Agora aprendi por que o mundo dá volta

Quanto mais a gente se solta

Mais fica no mesmo lugar

Na Volta que o Mundo dá é uma canção de autoria de Vicente Barreto e Paulo César Pinheiro e, em 1988, foi gravada pela cantora Mônica Salmaso no seu disco Trampolim. A versão de Vânia Abreu foi gravada em 1999 e faz parte do disco Seio da Bahia.

Aperta o play pra ouvir Vânia Abreu cantando Na Volta Que o Mundo Dá!

Morar Fora: Expectativa x Realidade

Migrar exige muita cautela, preparação e vai além dos aspectos apenas burocráticos. Cuidar de nossos documentos e das questões legais para viabilizar essa empreitada é apenas uma parte de algo bem maior. É muito importante, também, cuidar de nosso emocional. Muito desse cuidado vem de aprender a equilibrar a nossa expectativa e a realidade que estamos prestes a encontrar.

No segundo episódio do nosso podcast (Esperanças e Expectativas no Processo Migratório) falamos de como, na primeira fase da migração, as expectativas altas podem levar a grandes decepções. Quanto mais idealizamos a vida no novo país, mais difícil fica aceitar a realidade quando, finalmente, conseguimos percebê-la. O autocuidado, sob a forma de reflexão constante e atenção com nós mesmas(os), pode nos ajudar a mantermos a conexão com a realidade.

De forma semelhante, devemos atentar para certas comparações que fazemos. No processo de migração, a busca por informação é fundamental, mas nos compararmos com outras pessoas pode também atrapalhar. Sabe aquela sua conhecida que aprendeu a falar o idioma local rapidinho e já arrumou um emprego? Aquele seu conterrâneo que conseguiu tirar a cidadania em tempo recorde? Ficar se atormentando e procurando as razões pelas quais você ainda não conseguiu chegar ao mesmo patamar não vai ajudar em nada o seu processo.

Na migração, as pessoas podem até passar por processos psíquicos semelhantes (o estranhamento, as decepções, a euforia, a saudade, entre tantos outros), mas não podemos esquecer que, ainda assim, temos histórias de vida próprias e nossas trajetórias na imigração também são influenciadas por nossas individualidades.

Uma sugestão: se você está pensando em emigrar, ou já está morando fora, evite comparar sua trajetória com a de outras pessoas e qualificar suas conquistas de acordo com os marcos da vida dos outros.  Ao invés disso, procure se informar bastante, focando sua atenção nos aspectos práticos que, de fato, são relevantes para você (por exemplo, saber como deve ser um currículo de profissional da sua área, onde há cursos de idiomas, etc).  

Paralelo a isso, crie o hábito de refletir e de entrar em contato com você mesma(o). Você tem respeitado a sua maneira de resolver as coisas? Como você está se sentindo em meio a tudo isso? Você consegue pedir ajuda se precisar?

Deixar tudo para trás e se aventurar em outro país nos leva para dentro de um emaranhado burocrático e emocional. Olhar para dentro de si, nesse processo, ajuda a trilhar um caminho do seu jeito, sem pressão, evitando que você se perca. Sob essa perspectiva mais amorosa, a migração também pode te proporcionar uma gratificante viagem de autoconhecimento.

Clica aqui pra ouvir o episódio “Esperanças e Expectativas no Processo Migratório”.

*Por Cris Oliveira