Do outro lado da migração: a história de Helena Lara

Oi, eu sou Helena Lara. Eu sou psicóloga e moro aqui no Brasil, em São Paulo capital. Quem migrou foi meu filho, que se chama Guilherme. Eu não sei dizer exatamente qual foi a motivação dele de migrar, mas eu posso dizer o que foi que acentuou a vontade dele de ir embora. Desde que o Guilherme era pequeno, por exemplo, já com uns 7 anos de idade, ele dizia que ia embora para os Estados Unidos. Eu achei estranho no começo, porque nem na nossa família e nem no nosso grupo de amigos não tinha, na época, ninguém que tivesse migrado. Ele não tinha escutado relatos de migração de ninguém para poder se sentir encantado com isso. Como um apreciador de basquete, ele gostava muito de Michael Jordan. Isso e a vontade de jogar basquete acentuaram a vontade dele de ir para os Estados Unidos.

Quando ele entrou para o ginásio, eu o coloquei em um curso de inglês e ele amava, se dedicava bastante. Conhecia muito sobre os Estados Unidos e gostava de assistir programas americanos, até cobria as legendas para poder praticar melhor o idioma. Eu brincava, dizendo que ele tinha nascido no país errado. Com toda certeza, chegou um dia em que decidiu ir e foi.

Ele foi em 2014 e nós usamos as chamadas de vídeo para conversar. De certa forma, é gostoso, pois ele me mostra os lugares onde está, e eu posso conhecer um pouco da sua vida lá. Isso alivia muito! Eu sempre falava: no ano que vem vou vê-lo. Mesmo sem ter uma organização de fato para isso, sempre falava e isso me acalmava e aliviava a minha saudade. Meu filho faz falta. Ele é muito companheiro, inteligente, e eu acho muito bom conversar com os filhos, mas eu sei que ele está feliz. Ele me conta que se sente em casa lá. É bom escutar isso e não tem como não desejar que ele também siga com essa sensação de pertencimento! 

A única coisa é que a saudade é forte, ela arrebenta com a gente. Após ele ir, em 2016, a saudade foi apertando de fato e foi muito interessante notar que, quando acordava, muitas vezes tinha a sensação que tinha havia abraçado ele, tocado nele. A minha filha Fernanda escutou este meu relato, ficou quietinha e me deu um saquinho de presente no dia das mães. Um saquinho bem leve: era uma bolsinha para passaporte com o dinheiro da passagem! Uau! Com este lindo presente dela e do meu genro, em 2017, nós três embarcamos e fizemos uma surpresa para o meu filho, com a ajuda da minha nora (que na época era namorada e hoje é a sua esposa!). Foi tão bom!

Quando ele veio para o Brasil foi tão gostoso também! Reunimos a nossa família, que é bem grandinha! Foi tão bom fazer o bolo que ele gosta, caprichar no café da manhã, ver ele no sofá, estar ali perto. É a coisa mais desejada do mundo! E ele também voltou quando a Fernanda se casou e foi muito importante para todos nós! A Fernanda falou que não se casaria se ele não estivesse aqui, porque ele é importante e próximo dela.

E ele também retribuiu a nossa surpresa, me fazendo outra junto com a Fernanda. Foi maravilhoso abrir a porta e vê-lo! 

Ele foi o primeiro filho que saiu, foi meu primeiro sentimento de ninho vazio. E todas as vezes que conversava com a minha filha, que sempre teve um ótimo relacionamento com o irmão, terminamos falando que tínhamos a certeza que ele estava feliz, realizado. Isso trazia aconchego para nós!

A imigração dele foi muito desejada e ele faz tudo para dar certo, já conquistou o seu visto de trabalho. Ele quer ficar lá e eu imagino que vai ficar.  Algumas pessoas me dizem “ele vai voltar”, talvez pensando que isso me consola, mas para mim está bem definido e claro, desde o dia que ele foi. Quando fui visitá-lo, vendo aquele país, eu mesmo falei para ele ficar lá. É um bom país para se desenvolver, inclusive no seu trabalho. Ele tem mais alcance nos aspectos que ele valoriza. 

Eu admiro essa vontade dele de imigrar. Eu nunca tive essa determinação de mudar de país, mas pelo fato dele estar lá, eu penso ou brinco de tentar passar alguns meses. Não visualizo uma mudança, pois eu acho que ficaria dividida, porque tenho minha filha no Brasil. Se um dia ela e o meu genro se mudassem, talvez eu ficaria um tempinho com um, um tempinho com o outro. Quem sabe? Ainda tem a questão do idioma, que seria um pouco complicado. Acho que teria que ser algo forte para eu sair daqui do Brasil. 

Nós conversamos há pouco tempo sobre a imigração dele e acho que, para quem imigra, o mais difícil é não estar perto nos momentos e datas importantes da família, como aniversários ou a perda de um familiar, por exemplo. São diversos os fatores que impedem a pessoa de estar rapidamente aqui. Porém, são escolhas em que se ganha em diversos aspectos e balanceia as perdas. Ele participa da forma que dá e que hoje é possível, como pelas chamadas de vídeo. 

Eu desejo que tudo seja possível para ele, que tudo dê muito certo, aliás, já está dando! Ele se sente em casa lá e é bom vê-lo assim. Desejo também que ele viva feliz com a esposa dele, que é uma pessoa muito guerreira! Que continue a ser esse homem maravilhoso que ele é! E, se pudesse pedir mais, seria alguns netinhos gringos! Já pensou?

Nós do Continuidade agradecemos imensamente à Helena Lara, por nos presentear com o olhar e a história da sua família. Que vocês possam sentir o aconchego que sentimos daqui ao escutá-la e a ao ler as suas palavras! Vielen Dank, Helena! Obrigada! Thank you!

Crianças Migrantes

Aqui no site e no podcast, nós tecemos nossas “conversas” sobre como se desenvolve a migração a partir dos aspectos emocionais, de como a sentimos, a vivenciamos e caminhamos no novo país de acolhida. Os nossos passos podem ser largos, calmos ou temerosos. Muitas vezes, somos acompanhados por passos pequeninos, curiosos ou ressabiados: os passos das crianças que nos acompanham nesta nova trilha de línguas, costumes e gostos. E nós, preocupados em andar para frente, muitas vezes não percebemos como são estes movimentos das nossas crianças e os seus olhares. Hoje, vamos dar o palco a elas! Se aconchegue!

A percepção da criança da “nova casa” ou do lar que fala duas línguas e que se divide em voos emocionados para outro país onde parte da sua família está, pode ser construída e influenciada pela fase de desenvolvimento que ela se encontra (e da compreensão cognitiva e emocional que pode ser possível em cada idade), pelas características de personalidade que está se desenvolvendo (o jeitinho tão característico de cada um), pelas características familiares e pelos estilos parentais de educação (como são geralmente as condutas dos pais no dia a dia). Além disso, podemos somar outros ingredientes na nossa “poção mágica” da vida de migrante, que são os aspectos que motivaram a migração, as expectativas dos cuidadores das crianças frente ao novo país e como ele pode impactar na vida do filho, por exemplo, na possibilidade de uma melhor educação e no tão sonhado multilinguismo. Faltaram alguns ingredientes? Então vamos colocar a receptividade e as características do país de morada. Que poção e tanto!

Foto: Mauricio de Paula (Flickr)

Uma coisa é certa: essa poção será única para cada família e para cada fase em que se encontra. As crianças podem sentir ansiedade e estranhamento diante dessa combinação, de tantas mudanças ou frente à agitação dos adultos, que também estão se acostumando à nova sociedade e à própria tarefa de serem pais dessa criança que muda tanto (não é se reaprende a ser pai em cada fase?!). As crianças podem estranhar também os novos sons da língua e como é fazer amizades e brincar usando outras palavras e outros códigos sociais. E neste momento podem vir pedidos como “eu queria ir para a casa”, referindo-se ao país de origem, solicitações de ajuda com o idioma e com expressões emocionais de que algo incomoda ou mexe, como dificuldade para dormir, episódios de choro, de irritabilidade e uma maior necessidade de estar perto dos pais ou das pessoas que falam a língua materna. É preciso observar e construir o conhecimento sobre o que os comportamentos e as emoções estão dizendo sobre a sua criança e o que será que ela está precisando neste momento, como acolhimento, pisar no freio ou de um bom incentivo e também de boas parcerias com o entorno (com a escola, outros mães e pais e quem mais puder se juntar nesta rede de cuidado). 

Por outro lado, as crianças podem nos relatar encantamentos com os seus olhos atentos e curiosos de quem observa, escuta e está construindo a sua forma de ver o mundo. Com os olhos menos embaçados que os nossos, elas podem nos apontar para constâncias das ruas que nunca percebemos, mesmo estando ali todos os dias. Podem gostar logo de cara de sabores novos e pedir para repeti-los com a maior carinha boa. Podem nos fazer falar com outras famílias de nacionalidades diferentes, porque as crianças resolveram espontaneamente que aquele era o momento de brincar (e de conhecer este mundo!). 

E o que elas estão querendo dizer com as suas facilidades ou com suas inquietações? Preparem bem os ouvidos e os olhos, como se tivessem assistindo o ápice de uma peça de teatro, onde os nossos pequenos gigantes irão contracenar em grande e bom tom um manifesto: “ei, escutem a gente! Temos muito o que falar e somar! Sabemos de tanta coisa!”. E ousamos complementar e incentivar a importância de ouvir a voz da criança e dar a oportunidade dela nos contar o seu olhar! Nós podemos nos surpreender – e falamos aqui, com o sorriso no canto da boca, lembrando de situações sábias que eles nos ensinaram. Podemos incentivá-los, com isso, a se desenvolverem entrando em contato com as suas emoções, expressando-as, mesmo que de forma desajeitada (aliás, nós também fazemos muitas vezes assim, não é?!) e sentindo que têm voz e que são cuidadas, quando isso for preciso. É difícil, para eles e para nós – mas é um caminho tão promissor! 

No próximo episódio, vamos dar o microfone às nossas crianças, para que elas possam contar a sua história de migração. O protagonismo será delas! E esperamos que aí, durante a conversa na sala de estar, na cozinha, antes de dormir ou no caminho para o supermercado, aconteça o compartilhar de sensações, emoções e pensamentos! 

“Água é uma gota de chuva

É uma gota de nuvem

É uma gota de água para viver”

(Palavra Cantada – De Gotinha em gotinha) 

Por Daniele Stivanin

Imagem de destaque: GraceOda_ (Flickr)

EP 79 A Migração e Suas Linguagens

No episódio de hoje, abrimos uma caixinha de temas relacionados às linguagens e à comunicação na migração. Falamos sobre algumas controvérsias no universo da linguística e discutimos os motivos pelos quais Língua e Migração são temas inseparáveis. Vem escutar e depois conta pra gente o que achou.

Neste episódio nós indicamos um artigo que fala sobre a controversa expressão “Migrationshintergrund” no alemão.

https://mediendienst-integration.de/artikel/alternativen-zum-migrationshintergrund.html

Indicamos também o livro de Deborah Cameron, Verbal Hygiene. Neste livro ela analisa algumas atitudes dos falantes em relação à linguagem. Ela também faz uma interessante análise sobre os movimentos pró e contra a chamada linguagem “politicamente correta”.

O linguista Marco Bagno falou sobre esse assunto também. 

Workshop Online: “Relacionamentos na Migração e as Constelações Familiares”

Estamos super felizes em anunciar que vem aí mais um Workshop do Continuidade! O nosso encontro acontecerá neste sábado, dia 25 de setembro, das das 10:00h às 13:00h (Horário de Berlim). E nem precisa se preocupar em sair de casa, viu? O workshop será online, através do Zoom. A contribuição é de entre 15€ e 20€.

Neste encontro, vamos focar principalmente nas relações familiares e em como elas podem afetar a nossa saúde mental. Através do conhecimento da constelação familiar sistêmica convidamos você a refletir quais aspectos de seus relacionamentos (sejam eles interculturais ou não) são importantes para dar continuidade ao seu processo de desenvolvimento emocional e de cuidado da saúde mental. Esse conhecimento lhe ajudará também no entendimento de comportamentos das gerações familiares futuras: filhos, sobrinhos, netos.

Esse aprendizado pode fazer diferença na forma como lidamos com os desafios nque envolve a relação com a nossa família. Além disso, queremos despertar a sua curiosidade e empatia pela sua própria história intergeracional, assim como pela de quem te cerca.

Vamos descobrir juntos as dinâmicas inconscientes que podem ilustrar os movimentos dos nossos relacionamentos amorosos e migratórios? Vamos aumentar suas possibilidades de ação diante aos desafios de morar fora e formar família?

A gente espera você no sábado, dia 25 de setembro!

Quando: 25/09/21, das 10:00h às 13:00h (Horário de Berlim)
Onde: Pelo Zoom
Contribuição: entre 15-20Euros*
Vagas limitadas!

CLIQUE AQUI PARA FAZER A SUA INCRIÇÃO

*Atenção! Se o seu interesse é grande, mas não pode pagar esse valor no momento, entre em contato com a gente. O valor da contribuição não deve impedir a sua participação.

Histórias de Migração: Silvana Fernandes

Olá, eu sou Silvana Fernandes e venho de uma cidadezinha perto de São Paulo, chamada Santa Isabel. Santa Isabel não tem tanta coisa, mas tem muitos sítios, natureza e algumas cachoeiras. Na minha família, somos dois irmãos e eu.

Eu vim pra Alemanha em 1988. Dia 08 de maio de 1988. Então, amanhã fará exatmente 33 anos que eu estou na Alemanha. Eu vim pra cá porque  que eu tinha um amiga que estava morando aqui. Eu trabalhava em um banco no Brasil e estava bem. Era sub-gerente e, quando pedi demissão, meu chefe falou: “você está louca? Você vai ficar no meu lugar!”. A ele eu respondi: “não, eu não quero. Eu quero é viajar e conhecer o mundo.” E foi isso que eu fiz. Comprei uma passagem de um ano e vim pra Alemanha.

Nesse meio tempo, conheci um amigo do marido de uma amiga que começou a me escrever e começamos um romance. Eu cheguei aqui, a gente se encontrou, se deu bem e acabamos indo morar juntos. Essa relação durou 19 anos e, dela, eu tenho dois filhos, Maurício e Juliana. Maurício já vai fazer 30 anos em junho e a Juliana vai fazer 25 agora em maio.

Depois do término do meu relacionamento eu comecei a cuidar de mim. A princípio eu me sentia como o bagaço de uma laranja. Eu era a mulher do Torsten, a mãe do Maurício e da Juliana. Daí, eu fui procurar quem que era a Silvana. Foi quando eu comecei a pensar no que que eu ia fazer.

Durante todo esse tempo, eu só trabalhava em gastronomia e decidi fazer uma reorientação profissional. Estudei Comércio Exterior aos 46 anos. Terminei o curso em 2 anos e, poucos dias depois de me formar, já estava assinando o meu primeiro contrato. O que, a princício, era só para cubrir as férias de alguém, acabou se tornando um contrato permanente e eu estou nesta firma até hoje. Comércio exterior era, na verdade, exatamente o que eu queria ter estudado no Brasil. Eu tinha passado no vestibular, mas, na época, eu trabalhava no centro de São Paulo e a faculdade na qual eu tinha passado era em Sao Bernardo e não tinha como eu sair às 6 horas do banco e estar às 7 horas na faculdade. Às vezes, na vida, os nossos sonhos demoram um pouco para se concretizarem, mas eles chegam. Hoje, eu adoro minha profissão.

Quando eu cheguei aqui na Alemanha, eu não tinha muitos amigos brasileiros e, com os alemães, é mais difícil de a gente se entrosar. Apesar disso, eu tenho a Anne, uma amiga alemã daquela época, e nós somos próximas até hoje. No começo, eu não gostava muito da Alemanha. Eu já tinha morado no Brasil entre 1993 e 1994 com meu marido, na época que eu ainda tinha apenas meu primeiro filho. No Brasil, nós abrimos um supermercado, mas a inflação no país estava muito alta e não conseguimos manter o negócio. Desmontamos tudo, vendemos e voltamos pra Alemanha.

Meu marido sempre quis morar fora, então, em 2000, fizemos nossa segunda migração. Fomos para Portugal, desta vez com dois filhos, e vivemos um ano lá. As crianças iam para a escola, mas como eu sempre falei português com meus filhos, elas não tiveram dificuldade. Apesar do português de Portugal ser diferente, eles conseguiam se comunicar.

Mas Portugal também não deu certo. Na mesma época, os meus pais estavam me chamando para voltar pro Brasil porque eles tinha uma padaria e queriam que a gente a gerenciasse, para que eles pudessem se aposentar. Nós voltamos para lá, mas, infelizmente, o meu agora ex-marido não se adaptou à situação e acabou voltando antes.

Eu ainda tentei continuar vivendo no Brasil com as crianças, mas também não deu e acabei voltando para cá em 2002. Neste ano, minha filha mais nova entrou para a escola aqui e, em um determinado momento, me deu um clique e eu pensei: “agora eu vou ser feliz na Alemanha!”.

Parece que funcionou, porque, a partir daquele ponto, eu passei a adorar este país. Eu, por exemplo, sempre quis estudar alemão. Nessa época, já falava a língua, sempre fui me aperfeiçoando e olha… minha decisão de ser feliz aqui deu certo. Eu adoro a Alemanha e gosto muito de morar aqui.

Eu nao lembro de ter tido experiências ruins. Só no começo, quando eu ainda falava inglês. As pessoas me tratavam muito bem nas lojas porque, acredito, achavam que eu era turista, mas quando eu comecei a falar alemão e elas percebiam que eu estava ali para ficar, já me tratavam um pouco diferente. No entanto, sempre tive uma personalidade forte e, mesmo quando as pessoas reagiam mal e gritavam, por exemplo, quando eu trabalhava na gastonomia, eu sempre revidava: “eu não sei falar alemão, mas eu não sou burra!”

Uma das coisas que mais me enchem de orgulho, realmente, é o fato de eu ter me separado, estar aqui na Alemanha e ter lutado, mesmo aos 46 anos, para me reorientar profissionalmente, ter conseguido fazer o que eu gosto.

Quando ainda era casada, meu marido cuidava de todos os papéis e eu, apesar de saber alemão, tinha a escrita bem ruinzinha. Porém, falei pra mim mesma que eu ia me virar e fiz tudo que eu precisava fazer, mesmo com medo. Eu, as vezes, pensava: “ai meu Deus, como é que eu vou estudar economia em alemão?” Mas eu fui lá, fiz e deu tudo certo.

Daqui a dez anos eu gostaria de estar aposentada e, se eu estiver em um relacionamento, de poder continuar morando aqui na Alemanha, mas passar uns três ou quatro meses no Brasil. Eu não tenho certeza se vai ser possível porque a novidade é que agora, também no mês de maio, eu vou ser avó de uma menina. Isso significa que a minha família já vai entrar na segunda geração de migrantes. A namorada de meu filho também nasceu aqui, mas é descendente de chilenos. Vai ser uma bela mistura!

A minha filha tem muito desejo de morar no Brasil. Ela adora e acha que lá é o país dela, muito mais do que aqui. Sempre digo pra ela terminar a sua faculdade, fazer o que ela tiver de fazer e ir pro Brasil tentar sim. Porque não? Eu dou a maior força.

Se eu pudesse voltar o tempo e dar um conselho para mim mesma, diria: “aprenda a língua o mais rápido possível”. Na minha opinião, você só se integra no país onde está morando se souber falar a língua. E mais: “não se rebaixe. Você não é menos do que ninguém, você só não sabe falar o idioma… ainda”.

Eu sou Silvana Fernandes e essa é a minha história de migração. Qual é a sua?

Dia Mundial do Livro: como anda o seu hábito de leitura?

Hoje, 23 de abril, é comemoramos o Dia Internacional do Livro. Essa data nos convoca a pensar sobre o que a escrita e a leitura representam para cada um de nós. O livro é algo próximo a você ou é um hábito distante e pouco acessível?  

Essa celebração surgiu na década de 1920, na Espanha. Incialmente, foi escolhida a data do nascimento de Miguel Cervantes, importante autor espanhol.  Com algumas reformulações feitas dentro da própria Espanha, a UNESCO, mais tarde, institui, em 1995, o dia 23 de abril como o Dia Mundial do Livro, sendo esta data reconhecida também por outros países.  A escolha é uma em homenagem à data de falecimento de Cervantes, Willian Shakespeare e Inca Garcilaso de la Vega.

E o que comemoramos ao pensar nos livros e na nossa relação com eles? Talvez recorramos às memórias dos primeiros livros que nos encantaram e que foram verdadeiros momentos de desvendar mistérios ao juntar e significar as letras: aquela única frase na página dava um trabalhão para ler e trazia tantas ideias, perguntas e risadas! Podemos lembrar, quase com nitidez, as cores, a capa, as ilustrações, a textura e o cheiro destes primeiros livros. Era uma nova porta de acesso às palavras, à imaginação e aos sentimentos.

Os encantos dessas primeiras experiências podem assumir outros tons em diferentes épocas da vida, nos aproximando ou nos distanciando da leitura (e por que não da escrita também?).

Com os livros, podemos conhecer outras realidades, épocas, costumes e lutas. Através das descrições e narrações dos autores, podemos desenhar na nossa imaginação como são as personagens, os cenários – e podemos colocá-los, inclusive, dentro das nossas próprias cidades. Podemos nos sensibilizar com outros contextos e nos surpreender como outras formas de viver são possíveis e tão autênticas como aquelas que nós conhecíamos. Expandimos o nosso olhar, não é?

Foto: Eu Sou Famecos

Podemos nos surpreender com as tomadas de decisão de cada personagem, com essa rica vida emocional de cada um. Terão os que escolhem ir, os que escolhem ficar, os que lutam, os que morrem, os que matam, e os que gentilmente nos demonstram cada emoção, como se estivéssemos dentro deles. Percorremos caminhos e histórias emocionais tão semelhantes ou tão diferentes de nós, mas, ouso dizer, que por saber alguns trechos das histórias delas, nós entendemos os seus fios condutores de certa forma – nós os desculpamos, aceitamos as suas justificativas e, por vezes, assumimos um pouco da proteção e da empatia por eles.

Neste mundo de histórias, descrições cheias de metáforas ou bem duras e diretas, podemos nos conectar com os nossos sentimentos, nossos conhecimentos e transcender na nossa imaginação.  É um ganho e tanto, não é? E mais: podemos ser também autores. Por que não?

Como imigrantes, os livros podem ser momentos de contato com a nossa primeira língua, com a realidade tão conhecida.  Por sua vez, os livros do novo idioma podem trazer elementos até então desconhecidos da nova cultura e poderão ser um ponto de aproximação com a nossa nova morada.

Como anda o seu hábito de leitura?

* Por Daniele Stivanin

Imagem de destaque: Farley Santos
Fonte: Brasil Escola

Giro Pelo Mundo: 5 dicas do que fazer no Porto

Em 2020, Portugal ganhou – pelo quarto ano consecutivo – o prêmio internacional World Travel Awards, reconhecendo o país como o melhor destino turístico da Europa naquele ano. O Porto ajudou e muito para isso, arrematando o prêmio de melhor destino europeu para uma escapadela urbana.

A cidade é mesmo encantadora! A vida tranquila do “interior” contrasta com as noites vivas de festa, principalmente marcada pela forte presença de estudantes universitários de todo o mundo. Isso sem falar dos inúmeros miradouros para apreciar a vista do Rio Douro. É de tirar o fôlego!

Passear pela Ribeira é um clássico. Isso todo mundo já sabe, né? Nesse post, vamos um pouco além do Douro e separamos 5 dicas imperdíveis do que fazer no Porto (mas só quando a pandemia acabar, combinado?).

1- Subir na Torre dos Clérigos

Foto: Lali Souza

Um dos principais pontos turísticos da cidade, a igreja e a torre formam parte do Conjunto Arquitetônico dos Clérigos, reconhecido como Monumento Nacional desde 1910. O projeto da torre, criado pelo arquiteto italiano Nicolau Nasoni, foi apresentado em 1753, mas somente 10 anos mais tarde, em 1763, a obra foi dada como finalizada.

A torre tem 75m de altura e, para chegar no topo, é preciso enfrentar 225 degraus.

Se você sofre de algum tipo de claustrofobia, cuidado! Talvez esse passeio não seja para você, pois, conforme vai subindo, a torre fica mais estreia e, no final, só é possível passar uma pessoa por vez. Bem apertado mesmo!

Se esse não é o seu caso, vale a pena vencer o cansaço e subir. A vista da cidade é linda de se ver!

2- Pôr do sol no Jardim do Morro

Jardim do Morro. Foto: Tiago Lopes, para Publico.

Eu sei, falei que iríamos além do Douro, mas não dá para ignorar a presença desse gigante! O Jardim do Morro fica do outro lado da Ponte Luiz I (por sinal, vale a pena cruzá-la por cima e a pé), na cidade vizinha, Vila Nova de Gaia. A vista é das mais lindas do mundo. Vale a pena investir uma horinha para sentar e curtir o pôr do sol, sem pressa.

3- Comer Sanduíche de Pernil com Queijo da Serra da Estrela na Casa Guedes

Foto: Casa Guedes Oficial.

A Casa Guedes nasceu em 1987 e já faz parte da história do Porto. O pedido clássico é uma “sandes de pernil com queijo de ovelha” e vale a pena demais experimentar. O sanduíche é bem molhadinho e o famoso queijo da serra da estrela dá um toque pra lá de especial. Para acompanhar, uma Superbock – a maior cerveja local, orgulho do norte de Portugal – fresquinha!

4- Comer Francesinha no Lado B

Parece inofensivo, mas por baixo desse queijo tem pão, bife bovino, salsicha, linguiça e presunto.
Foto: Lali Souza

O Café Santiago é, talvez, o point mais famoso para comer uma boa Francesinha no Porto. Mas eu gosto mesmo é da comida do vizinho, o Lado B! Ele fica na região da baixa, em frente ao Coliseu. Ah! Além da Francesinha, vale a pena provar os pastéis de bacalhau também. São uma delícia!

5- Passeio na Orla de Matosinhos

A gente já viu o rio, agora, vamos ao mar! A orla de Matosinhos tem um calçadão ótimo para dar um passeio. A praia tem uma faixa de areia larga. Dá para sentar e curtir a brisa do mar ou praticar esportes. Só cuidado na hora de entrar na água, hein? É muito gelada!

É claro que esse é só um “gostinho” do que fazer no Porto, pois a cidade oferece inúmeras outras atrações fantásticas. Isso sem falar na noite agitada, nas festas e bares. O Porto é, com certeza, um destino que você deve incluir na sua lista de desejos.

E ai? Já conhece o Porto? Diz para gente nos comentários qual é a sua dica imperdível sobre a cidade.

Por Lali Souza

*Imagem de destaque: Tim Chelius por Pixabay

*Fontes:
https://www.melhoresdestinos.com.br/premio-turismo-europa.html

http://casaguedes.pt/?l=pt

http://www.torredosclerigos.pt/es

Canções de Migração: Sweet Virginia

Sabe aquele frio na barriga que dá quando a gente decide imigrar? É dessa sensação que a música de hoje me faz lembrar. Aquele medo de sair de casa, somado a toda esperança de que o novo será tão bom quanto, se não melhor.

Sweet Virginia é uma canção de Keith Richards e Mick Jagger. Foi lançada pelos The Rolling Stones em 1972, fazendo parte do álbum Exile on Main St.. Nela, o eu lírico se despede da sua vida na Califórnia para ir rumo a novas vivências no estado da Virginia.

Ainda que a canção não deixe claro se a Califórnia é ou não o seu lugar de origem, era lá onde ele estava. Ele se despede com carinho, agradecendo pelo que foi bom, mas também pelo que não foi assim tão doce.

Thank you for your wine, California
Thank you for your sweet and bitter fruits

Obrigado pelo seu vinho, Califórnia / Obrigado por suas frutas doces e amargas

Na mesma sintonia, ele pede à Virgínia que “venha de mansinho”, na intenção de que essas novas vivências sejam positivas.

But come on come on down Sweet Virginia
Come on honey child I beg of you
Come on come on down you got it in you

Mas aproxime-se, venha de mansinho, Doce Virginia
Venha, querida, eu imploro por você
Aproxime-se, venha de mansinho, você tem isso dentro de você

Aperte o play pra ouvir a música!

Agora é sua vez: qual canção de migração você gostaria de ver por aqui? Conte para a gente nos comentários!

*Por Lali Souza

Mulheres Migrantes: Rupi Kaur

A escritora e poetisa Rupi Kaur nos inspira, não somente pelo seu trabalho, mas pela força com que defende as mulheres e os nossos direitos. Hoje, aproveitamos esse espaço para falar um pouco sobre ela, sua história de migração toda a luta que representa.

Rupi Kaur cresceu no Canadá, onde foi morar com sua família quando ainda tinha 4 anos. Ela nasceu na Índia, na cidade de Panjabe. Dentro do Canadá, chegou a morar em várias cidades diferentes e, hoje, tem residência em Brampton, na província de Ontario.

A sua hstória com as palavras e a literatura começou desde muito nova. Em entrevista ao site El Mundo, ela conta que escrever foi a sua forma de se libertar das dores que sentia por ser uma criança tímida e solitária, que era perseguida na escola.

O seu refúgio saiu do papel e ganhou o mundo online. Foi através de textos publicados em redes sociais que Rupi se tornou conhecida, principalmente pelo cunho feminista de suas palavras. Ela ganhou vizibilidade internacional quando, em 2015, uma fotos publicadas no Instagram, na qual aparece deitada e com a roupa manchada de menstruação, foi excluída duas vezes pela plataforma. A revolta de Rupi viralizou – e a imagem também – resultando na recuperação do post, acompanhado de um pedido de desculpas por parte do Instagram.

Imagem: Rupi Kaur

Rupi Kaur publicou o seu primeiro livro também em 2015: Outros jeitos de usar a boca (título original: Milk and Honey). A antologia fala sobre feminilidade, suas dores, abusos e capacidade de sobrevivência. Ela vendou mais 8 milhões de cópias e foi traduzida para 42 idiomas.

Despois do sucesso do primeiro, a autora já lançou mais dois livros: O que o Sol faz com as flores e Home Body.

Sobre ser uma pessoa imigrante, Rupi Kaur é gente como a gente e destaca que as suas dores são bem comuns àqueles que saem muito novos do seu país de origem. Ela se vê como uma pessoa de duas culturas, não perdeu a sua origem e está muito bem integrada ao local de acolhida. Por isso, diz que que “casa é um conceito complicado”.

“Aqui no Canadá, eles me olham e me veem de forma diferente, não me reconhecem como um deles, porque minha pele escura não se encaixa nos cânones ocidentais. Mas na Índia a mesma coisa acontece comigo, eles também me veem como uma estranha.”

Rupi Kaur em entrevista ao El Mundo, 2017.

*Por Lali Souza

Imagem de destaque: Rupi Kaur Oficial

Fontes:

Rupi Kaur – site otifical
Wikipedia
Fala Universidades
El Mundo

Ser Mulher

Nesta semana comemoramos o Dia Internacional das Mulheres. Além das famosas rosas que são entregues nesta data, este dia nos lembra a luta de muitas mulheres que vieram antes de nós, as dores, os avanços e os papéis que podemos e queremos desempenhar, inclusive na imigração.

O dia 08 de março relembra a luta de mulheres operárias, que antes tinham poucas possibilidades de ter um papel social e laboral fora de casa. Quando elas foram para as fábricas, se depararam com horas exaustivas de trabalho e condições muito precárias para exercê-lo. Ao reivindicarem melhorias e direitos, tiveram uma forte resistência, inclusive com uma represália que causou a morte de muitas delas. Esse fato tornou a data um dia mundial de lembrar as lutas que tanto desejamos e o quão necessárias elas são.

Tiveram lutas antes, como por exemplo, de ter concepções ou habilidades diferentes, e serem consideradas “bruxas” ou “loucas”. Depois disso, tiveram que lutar para votar (e em alguns lugares, isso é um direito recente ou ainda não é concedido), de escolherem seus rumos sobre os relacionamentos, sobre ter filhos (quando e se querem tê-los), de serem aquelas que dizem o que pode ou não ser feito com os seus corpos (e serem escutadas) e de desejarem ser quem quiserem (e da forma que quiserem).

Huelga Feminista Madrid, 8 de Março de 2020 | Foto: Lali Souza

Nestas mudanças, desejos, dores e lutas, muito foi conquistado, embora ainda tenhamos muito de construir em um caminho de mais equidade nas empresas, na política e em casa, no respeito e na diminuição dos índices de violência contra a mulher. Enquanto isso somamos a este turbilhão de sentimentos, desejos e realidade, as representações sobre o que é ser mulher, que fomos aprendendo desde o que era falado e autorizado nas nossas famílias de origem e nas nossas comunidades, e o que aprendemos em seguida nos diversos grupos que participamos. Inclusive no contato com uma nova cultura, no caso da imigração.

A imigração pode trazer formas diferentes de ver o ser mulher, se comparado com o país de origem, com ampliação dos direitos ou ainda mais restrições. A vida no interior da casa também pode ser alterada, quando, por exemplo, um do casal vem empregado e o outro precisa construir habilidades com a língua e validar a sua experiência profissional, para se inserir no mercado de trabalho ou nos estudos no novo país. E isso sem contar com as redes de suporte que antes conhecia. Neste momento, pode vir o medo de estar “dando passos para atrás” ao ser “responsável” pelas casas e pelos filhos ou não ter atividade remunerada. E isso é ser menos mulher?

Nós, aqui, consideramos que ser mulher autêntica é ser a mulher que lhe faz sentido, que cabe ao seu momento e que pode ser tão valioso como ser nomeada CEO de uma empresa. Por exemplo, se a escolha é desprender os esforços em cuidar do seu filho, que representa cuidar de um novo cidadão ou nova cidadã, isso não é um papel e tanto? Dar um tempo para se adaptar no novo país, considerando as condições financeiras da família, também pode ser uma opção de respeito consigo. E muitos outros exemplos que vocês e nós poderíamos citar aqui, sem julgamento ou avaliando com olhos de quem classifica o que é válido ou vale mais.

As lutas feministas aconteceram e acontecem para que o poder de escolha seja real, validado e autêntico para cada um. E é isso que desejamos a nós todas neste dia: que a gente continue caminhando, pessoalmente e como comunidade, para garantir o direito de ser quem se é e da forma que desejar, e ser respeitada (e respeitar). Que todas nós possamos completar a nossa apresentação “brasileira (ou do país que for), imigrante e …” com tranquilidade e sendo acolhida e valorizada da forma que somos (inclusive por nós mesmas). 

*Por Daniele Stivanin

Imagem de destaque: Aryl Irudayam